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18/04/2014

Trabalho para se orgulhar

Conversava com uma pessoa que admiro muito como mãe, profissional e esposa.
Ela me contava sobre a diferença entre vaidade e orgulho.
vaidade, me explicava, é algo que é alimentado do fora de nós. A opinião alheia, o aplauso, o tapinha nas costas, a avaliação de desempenho, a aceitação de nossa família, nossos colegas de trabalho. Segue o script, muitas vezes limitante, da régua das maiorias. Ancora-se, muitas vezes, na aparência, no preconceito, no medo de não pertencer.
orgulho, por outro lado, alimenta-se de algo nosso (e não estamos falando do orgulho de não saber pedir ajuda, o da soberba). Falamos do orgulho mais nobre, mais puro. Aquele enraizado em nossos valores, nosso propósito, o que faz sentido.
Se temos orgulho de nós mesmos, o outro não tem tanto peso. O orgulho ancora-se na nossa autoestima e no quão firme estamos apoiados em nossa bússola interna. Esta bússola, construída a partir do que aprendemos com nossos ancestrais, do que cultivamos na nossa espiritualidade. Do que acreditamos com toda a força de nosso coração.
Quem de fato sou eu? O que quero deixar para o mundo? 
Perguntas difíceis de responder, por isso olhamos tanto para fora.
Na busca deste gabarito, muitas vezes terminamos vazios, famintos.
Viver com sentido é a recompensa maior. Mas requer esforço.
Para atravessar medos. Para perdurar solidões.  Para dizer sim, este é o caminho, mesmo que inédito, mesmo que estranho.
Mesmo ao contrário do que todos me disseram ser o mais garantido.

A vaidade nos conecta com o outro. É um vício.  Se eu faço assim, interajo, obtenho resposta.  Infla-se meu peito, dá uma saciedade.
Só que é carboidrato, queima logo. Preciso de mais e mais, para me sustentar.
O orgulho é proteína.

O orgulho de bater no peito: "Eu fiz."
"Eu sobrevivi".
"Eu consegui".
"Eu sou quem eu quero ser".
Olhar para trás e ver um legado que valha a pena.
Olhar para frente e antever a possibilidade de melhorar o mundo.
Olhar para os erros e perceber que foram aprendizado.

A escolha é sua: como você vai nutrir o seu trabalho?
A partir da vaidade ou do orgulho?

O preço a qualquer preço

“Bom dia. Embarque ou conexão?”
Parecia uma pessoa do staff do aeroporto, mas não. Era um vendedor de uma editora, tentando me “fisgar”.
Sentei-me num lugar estratégico e fiquei acompanhando a operação.  Observando a franca irritação de alguns passantes, me pergunto. Por quê?
Por que alguém se submete a um subterfúgio destes para tentar capturar um novo consumidor?
Parece fácil condenar o vendedor e sua armadilha tosca.

Decido olhar mais fundo... Será que este vendedor gosta ou tem orgulho do que faz? Ou está pagando contas, buscando alguma estabilidade, atendendo a sonhos alheios do que é ser uma pessoa de sucesso?
A farsa da editora é  muito evidente. Não vi quase ninguém ir “só retirar o brinde” que levaria a um discurso de convencimento “compre uma assinatura”.
Na vida real, o dilema é mais sutil.  Será que estamos vendendo a nós mesmos e aos outros algo que não nos serve?
“Eu preciso deste trabalho porque preciso pagar contas”
“Eu não sei fazer outra coisa”
“Sou muito velho para começar de novo”
“Já investi muito neste caminho onde estou”
“Não tenho coragem”.
Todos os dias conheço pessoas buscando enfrentar estas questões. São perguntas difíceis, causadoras de grande sofrimento. Por que  tantos outros não conseguem encará-las?
Tudo é uma questão de preço. Muitas pessoas não percebem claramente o custo de um trabalho sem sentido, até a vida passar ou alguma crise acontecer.
Voltando para nosso exemplo. Um daqueles vendedores pode um dia se sentir maltratado. Outro pode achar que o dinheiro que ganha, não vale o esforço. Alguns, podem adoecer física ou emocionalmente, pelo desgaste de tanta rejeição.  Uns podem ter sonhos pulsando cada vez mais alto, até não sobrar energia para abordar clientes a caminho de seu voo.
E para alguns, somente alguns, chegará o dia em que dirão “chega, vou buscar outro trabalho ou vou ao menos tentar vender minha assinatura de uma forma diferente!”.
Para todos nós, o  preço pode ser a saúde física, o equilíbrio emocional, a falta de sentido. O preço  pode ser desperdiçar talentos, ignorar sonhos, engolir sapos além da conta.
Sim, é preciso pagar as contas. Mas a que preço?
O singelo exemplo do aeroporto evoca questões éticas, mas também não vi um ambiente estimulante no quiosque onde os vendedores se aglomeravam. Fiquei curiosa até quando vão tentar esta nova tática.
Também fico curiosa por entender o limite das pessoas, cada um tem o seu.
Quanto tempo é preciso para se repensar que tipo de trabalho queremos fazer? Quanta dor e incômodo estamos dispostos a vivenciar?
O Odisseia foi criado para estimular relações mais felizes com o trabalho. A reflexão é o primeiro passo neste sentido e esta é a intenção deste texto.
Qual o preço da minha escolha profissional hoje? 
Como eu posso interferir para que o que faço para pagar as contas também sirva para minha realização pessoal? 
O que está ao meu alcance para ter um trabalho que faça sentido?
Minha hipótese é que a resposta não está num script automático que vendemos para nós, justificando a situação atual... Descobrir suas respostas pode ser o primeiro passo para uma grande transformação.